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Crônica de Sorocaba - Diz-que-não-me-diz-que

CRÔNICA DE SOROCABA - Diz-que-não-me-diz-que 
 
 
NUNCA não se deve jamais de entregar... bem, ia, eu, já, a escrever: "os pontos antes da hora"; mas, não: da rapadura, não se deve abrir as mãos é a tempo nenhuns. E, entretanto, há fatos contra que não valem sequer as mais poderosas argumentações: por mais potentes (termo apropriado), o não serão mais que os próprios referidos fatos. Por exemplo: doravante, a ninguém de nós, nenhum brasileiro, nem mesmo algum caruaruense, será dado deixar de reconhecer que os argentinos, por final, venceram. Não, não digo, aqui, graças a Deus, de alguma disputa futebolística. Não, disso é que agora não se trata, ainda bem. As bolas são outras. Do que digo, contudo, quase que não mexe menos com os brios nacionais, sejam os "do lado de lá", sejam os "do lado de cá", como diria aquele locutor desportivo.  
 
Imagine-se, leitor enciumado, leitora fascinada, que um pedreiro argentino manteve-se com seu dele pênis uma semana inteira em estado de ereção contínua. É verdade, a agência internacional "Reuters" deu a notícia. É sabido como agências internacionais não mentem. Forçoso nos é, pois, reconheçamos: aqueles dançadores de tangos chegaram lá. Tiremo-lhes nossos chapéus, ainda que os não mais tragamos às cabeças. Arranquemo-lhes nossos capuzes ou os vistamos por inteiros. Uma semana é uma semana, uma ereção é uma ereção e uma ereção de uma semana é uma semana de ereção. Deve de haver brasileiros se roendo as unhas, e, assim, brasileiras se mordendo os lábios. Mas, como, neste mundo duro, este, sim, duro de verdade, nem tudo são perfeições, o caso do infeliz pedreiro teve não somente um começo infeliz, como também um desfecho nada menos do que apenas trágico.  
 
Héctor Viera, na força do homem, aos 34 anos, caiu do caminhão em que trabalhava, carregado de bolsas de chá. Não as bolsas de chá, mas, a queda malfadada, contundiu-lhe a coluna e provocou-lhe o indesejado priapismo. Que, prolongado, teve de ser tratado à base de injeções, o que, como se era de esperar, em se tratando da refinada medicina terceiro-mundista, acabou por lhe causar um quadro infeccioso. Os médicos resolveram o problema cortando-lhe o mal pela raiz: o senhor Héctor foi capado. O pedreiro disse que não havia autorizado a amputação de seu precioso órgão. Vai pedir uma indenização: "Vou brigar até a morte para provar que me deixaram inválido", proclama. É da morte que o diretor do hospital, o médico Sergio Cravetz, diz que o salvou: "Tínhamos que preservar a vida do paciente". Agora, impaciente.  
 
Já, do outro lado do mundo, na Índia, as coisas não vão tão mal para os castrados. As folhas, em todo o mundo, e mesmo em Sorocaba, anunciaram: os eunucos indianos resolveram lutar por sua dignidade. O dado espetacular é que se estima a cifra extraordinária de 1.200.000 como a do número de eunucos na Índia. Eunucos celebrizaram-se como guardas dos haréns mongóis. Secularmente desprezados e oprimidos, vêm, ultimamente, ganhando postos eleitorais. Um deles já se elegeu prefeito vencendo as demais candidatas para o cargo, lá, reservado às mulheres. O presidente de uma Associação pelo Bem-Estar dos Hijras (que é como eles ali se denominam), senhor Khairati Lal Bhola, denuncia que a quase totalidade dos eunucos "são meninos que foram raptados e castrados". E que, agora, atiram-se à vida política, como o fazem umas primeiras-damas no Ocidente, vide a senhora Clinton. E olhe-se que as motivações são afins. Assim, do lado de cá, tal, do lado de lá.  
 
O hindu Bhola deve de compreender a dor do senhor Héctor. E o inconformado argentino Héctor devia de mirar-se no exemplo do irredutível senhor Bhola. São, todos, mais ou menos brancos: que se entendam.  
 
Outra notícia é calorosa: diz que o século 20 foi o mais quente em 500 anos. A afirmação é do cientista Henry Pollack, da Universidade de Michigan, um norte-americano que tem as cabeças no lugar: "O século 20 foi o mais quente dos últimos cinco", declarou.  
 
Já se vê: o Brasil, qüingentenário e tropical, não é menos "caliente" que a Argentina, talvez, decerto, aliás, o será mais; e nem é tão menor assim que a Índia, onde tudo ocorre enquanto corre o Ganges. Regados pelo Amazonas e suas pororocas, o melhor é tomarmos, todos, nossos cuidados.  
 
Leitora amiga, leitor amigado, aprenda: com maior acerto agirá quem se exima de trepar-se em caminhões de chás, a menos que não se importe de fazê-lo pela vez derradeira, pois, pode-se cair, dali, e tudo, de lá, vir abaixo; mas, em qual se sucedendo, siga-se o modelo dos indianos, e, por fim, dê-se uma dentro: este ano é eleitoral e a esperança é sempre a última a dar o fora.  
 
Quem se candidata?  
 
 
Caderno  
 
Retrato da cidade, 
Um horizonte curvo 
Azula no horizonte 
Dos prédios da cidade. 
 
 
Nos prédios da cidade, 
Azula, do horizonte, 
Um horizonte curvo: 
Retrato da cidade. 
 
 
Eu olho pra cidade: 
Será que tem idade 
Pra ser minha menina? 
 
 
Eu sou da gente afoita 
Para aprender a coisa 
Que Sorocaba ensina. 
 
 
 
Paulo Tortello é poeta. Fone/Fax: (0xx15) 231-8218. 
E-mail: tortello@zaz.com.br  


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