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O frevo invade Salvador
O frevo invade Salvador
Leonardo Dantas Silva
Surgido nas ruas centrais do Recife, originário do repertório das bandas militares da segunda metade do século XIX, o frevo pernambucano passou a ser, a partir das primeiras décadas do século XX, uma constante nos repertórios das mais diferentes bandas de música e conjuntos de metais do Nordeste, conquistando, assim, simpatizantes em todo território nacional.
Em 1951, atendendo a um convite do seu congênere do Rio de Janeiro, o Clube Carnavalesco Misto Vassourinhas saiu do Recife e, a bordo de um navio do Lóide, iniciou uma viagem que veio mudar a história do frevo instrumental. Levava consigo "uma fração da Banda da Polícia Militar de Pernambuco composta de 65 músicos sob a regência do tenente João Cícero".
Um novo estandarte fora especialmente confeccionado em veludo, bordado com fios de ouro e pedrarias importadas, sob o patrocínio do Governo do Estado e um grande número de associados, reunindo as suas economias, embarcaram no navio e lá se foram apresentar-se nos cordões do Vassourinhas em plena Cidade Maravilhosa.
Na sua despedida do Recife, o clube saiu de sua sede social no bairro de São José, formando na Rua das Calçadas, como se fora fazer o seu tradicional "passeio". Tendo João de Emília como o seu primeiro porta-estandarte, envergando rica fantasia Luiz XV, ao som de sua Marcha nº 1, embarcou no cais do porto com destino à Cidade Maravilhosa, onde se apresentaria no carnaval daquele ano.
Aportando o navio em Salvador, cidade bucólica que ainda via os carnavais com as famílias povoando de cadeiras às calçadas da Avenida Sete de Setembro, o Clube Vassourinhas foi convidado a fazer uma rápida apresentação. Os integrantes do clube cruzaram o portaló, desceram as escadas que levavam ao cais, onde organizaram a formação do préstito. Com o seu rico estandarte alçado ao vento, morcegos fantasiados abrindo alas na multidão, formando círculo em torno dos porta-estandartes, balizas puxando os cordões, damas de frente e fantasias de destaque, diretoria vestida a rigor, tudo acompanhado por aquela fanfarrade 65 músicos; o maior conjunto de metais já presenciados em terras da Cidade do São Salvador.
Com seus metais em brasa, a banda militar que por tantas noites ensaiara sob a batuta de João Cícero, em pleno leito da Rua das Calçadas no bairro recifense de São José, viera incendiar as ruas da capital baiana e fazer história na música popular brasileira.
Ao ingressar na Avenida Sete, ao som de sua Marcha nº 1, composta em 1909 por Joana Batista e Matias da Rocha e conhecida nacionalmente como o Frevo dos Vassourinhas, a turba que acompanhava o clube tomou-se de delírio. No repertório outros frevos instrumentais se seguiram, alguns especialmente compostos para aquela primeira excursão fora do Recife: Vassourinhas no Rio, de Carnera (Felinto Nunes de Alencar); Vassourinhas está no Rio, de Levino Ferreira, e Um pernambucano no Rio, de Capiba.
Com o Vassourinhas nas ruas, os diabos tomaram conta de Salvador e o baiano, que não conhecia o frevo ao vivo executado por uma fanfarra de 65 músicos pernambucanos. Oritmo enlouqueceu a multidão que, ao aderir à onda, só sabia quando muito pinotar, pois nunca conseguiu aprender os verdadeiros passos do frevo. De forma tresloucada a multidão veio atropelar tudo que encontrava em sua frente. Após alguns quilômetros de itinerário, percorrendo toda Avenida Sete de Setembro, com a turba baiana no seu rastro, não acostumada às "regras" indispensáveis ao acompanhamento de um clube de frevo, pelas quais a orquestra é intocável, viera atropelar os músicos provocando com isso vários acidentes pelos encontrões com os mais exaltados. Já apresentando desfalques em sua orquestra, com alguns músicos com os lábios feridos pelo impacto com os foliões, o Clube Vassourinhas foi buscar refúgio no Palácio do Governo encerrando, assim, a sua primeira incursão em terras Salvador de São Salvador da Bahia.
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