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Frevo do Freveiro
Frevo de Frevereiro
Leonardo Dantas Silva
Em 1947, ao ser entrevistado para revista Contraponto, ainda motivado pelo clima do pós-guerra e dos sucessos de Carmen Miranda em Hollywood, o consagrado compositor Nelson Ferreira, fazia o prognóstico de que o “frevo pernambucano deve tornar-se conhecido, como a rumba, a conga, o swing, danças tão doidas quanto a nossa e olhe que isso não está longe. O samba já apareceu. Quando o frevo entrar no cinema americano, veremos o furor que provocará. Questão de oportunidade. [...] Tome nota: o frevo matará a conga, a rumba e o swing, quando aparecer um dia, num tecnicolor norte-americano”.
Já lá se vão mais de meio-século e o vaticínio de Nelson Ferreira não se concretizou, principalmente pela pouca divulgação desse ritmo tão marcante e por vezes de difícil execução, surgido no Recife na segunda metade do século XIX e ainda hoje em franca evolução coreográfica e instrumental.
Historicamente o frevo (música) tem suas origens no repertório das bandas militares sediadas no Recife na segunda metade do século XIX; a fusão do dobrado com a polca marcha veio dar origem a chamada marcha-carnavalesca-pernambucana, em uso quando dos desfiles das primeiras agremiações do nosso Carnaval. Muito embora seus acordes fossem coreografados por rabos-de-arraias, cabeçadas e pernadas dos capoeiras, ancestrais dos passistas de hoje, e o ajuntamento dos seus seguidores fosse conhecido por frevedouro, o vocábulo frevo só vem a ser registrado pela imprensa no Carnaval de 1907, segundo informa Evandro Rabelo. Neste ano o Jornal Pequeno, do Recife, ao anunciar o repertório da Troça Empalhadores do Feitosa, faz referência a determinada marcha intitulada de O Frevo.
Por ter tido o seu primeiro registro no dia 9 de fevereiro de 1907 é que se justifica o título dessa produção do multiartista pernambucano Antônio Carlos Nóbrega, Nove de Frevereiro.
Neste disco estão reunidos os muitos frevos do carnaval pernambucano: o frevo-de-rua, puramente instrumental, escrito originariamente para execução por orquestra de metais, a céu aberto acompanhado pela multidão de passistas em frevolência nas ruas do Recife ou de Olinda; frevo-canção, originário da ária [movimento, ou parte, para voz solista que integra uma ópera, cantata ou oratório], que recebe uma abertura orquestral a cargo de fanfarra de metais, quase sempre com dezesseis compassos, seguindo-se de partes cantadas, pelo solista e aglomerados de foliões nas ruas ou nos salões; finalmente o frevo-de-bloco, originário das loas dos pastoris natalinos, com sua introdução em andamento allegro, executada por orquestra onde predominam a família da madeiras (clarinetas, violões, violinos, flautas, contrabaixo, banjo, bandolins, cavaquinhos, etc.), seguindo-se do coro feminino a entoar as mais líricas canções do nosso carnaval.
Nos dias atuais, porém, o bloco carnavalesco transformou-se na mais festejada das agremiações, fazendo-se necessário, em suas apresentações, a presença dos metais (bombardino, trompetes, tuba), palhetas (saxofones) e vozes masculinas no reforço do coro original.
Como sonhara Nelson Ferreira, o frevo se não chegou ao tecnicolor, se transforma com este disco em gênero musical para ser ouvido no ano inteiro, graças aos arranjos orquestrais com a introdução do violino e outros instrumentos da família das cordas nas diversas composições aqui reunidas.
Com esta nova roupagem, o amante da boa música vai encontrar uma execução de um tipo de frevo para ser apreciado em qualquer época do ano, de tessitura agradável aos ouvidos mais sensíveis. Graças a arranjos musicais feitos especialmente por Clóvis Pereira, responsável pelas orquestrações de Último Dia e Mexe com tudo, verdadeiras pérolas de Levino Ferreira que integram a faixa 1, os frevos instrumentais ganharam roupagem de música de câmera e execução que nos fazem lembrar peças compostas por Johann Sebastian Bach (1685-1750) e Antônio Vivaldi (1678-1741).
A exemplo de Clóvis Pereira, outros arranjadores estão demonstrar a nova roupagem do frevo pernambucano: Edson Alves que, no arranjo especialmente escrito para Chuva Morna (Heraldo Monte), nos faz ouvir o frevo como se fosse uma composição camerística; Edmilson Capelupi, responsável pela orquestração de Folias da Madrugada (Toscano Filho), com solos de violino e bandolim; Zezinho Pitoco, em Capenga (Antônio Fabrício) e Mordido (Alcides Leão), proporcionando condições para da execução dos solos inesquecíveis, a cargo de violino, saxofone soprano, flautas e clarineta, de modo a permanecer por horas na memória auditiva dos mais acurados. Na mesma produção aparece o frevo-de-rua Isquenta Muié (Nelson Ferreira), com a sua execução antecedida pelas estrofes de uma cantiga de cego, seguida de um terno de Zabumba (também conhecida por Banda Cabaçal), em mais um arranjo de Clóvis Pereira, que, com sua profusão de instrumentos, nos fazem lembrar peças do competente Guerra Peixe escritas para Orquestra Armorial. Finalmente, vale registrar os arranjos do Maestro Duda, quando da execução dos frevos Quinho (Duda) e Transcendental (Cláudio Almeida), este último trazendo solos escritos para violino (Antônio Carlos Nóbrega) e saxofone soprano (Spok), aliando assim a virtuosismo dos instrumentistas à força melódica desse ritmo carnavalesco pernambucano.
No que diz respeito aos frevos-canção vamos relembrar velhos sucessos carnavalescos, gravados em suas orquestrações originais, como Sonhei que estava em Pernambuco (Clóvis Mamede), Cocorocó (Irmãos Valença), Dedé (Nelson Ferreira) e Vão me levando (Genival Macedo e Dozinho) Na faixa 6, A pisada essa, sucesso de Capiba para o carnaval de 1953, surge em nova roupagem, num arranjo de Clóvis Pereira com a sua introdução antecedida por loa do bumba-meu-boi: “Quero ver queimar carvão / Quero ver carvão queimar / Quero ver levantar poeira / Quero ver paia avoá...”.
Os frevos-de-bloco Ingratidão (José Menezes e Neuza Rodrigues) e Relembrando o Passado (João Santiago), são apresentados o primeiro por um conjunto próprio das serenatas, formado por violino, violões e pandeiro, seguindo-se do segundo, na última faixa do disco, impregnado da poesia e saudosismo da marcha-regresso ao anunciar o final de mais um carnaval.
Finalmente, toda história do frevo encontra-se condensada nas estrofes da embolada Nove de Frevereiro, composta para este disco por Antônio Carlos Nóbrega e Wilson Freire, que nas rimas dos seus versos sintetiza este nosso panorama de folião.
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