Baiano, A Dança
BAIANO
Dança viva, com coreografia individual, permitindo improvisações e habilidades de pés e velocidade de movimentos de corpo consagradores na apreciação popular. Era o baile do Birico e do Mateus (Rio Grande do Norte) ou de Mateus e Fidélis (Pernambuco) no bumba-meu-boi, sempre aplaudidos:
Toca bem esta viola
No baiano gemedô,
Que o Mateus e o Fidélis
São dois cabra cansadô...
O tocador da viola
Chama-se Feliciano;
Oh que belo mulatinho
Para dançar o baiano!
O baiano não era apenas dançado pelo povo mas executado também nas salas da sociedade. O Padre Miguel do Sacramento Lopes Gama (no Carapuceiro, n.º 77, Recife, 24-12, 1842), estudando os "Passatempos do Natal," escrevia: "Em funções de batizados, casamentos, havia minuetos rasteiros, os cotilhões e de ordinário arrematava-se tudo com o baiano, que então não se reputava dança imoral, como hoje em que os costumes vão se apurando, como se vê e todos admiram." A confusão na nomenclatura impossibilita a fixação de características. Já não se dança o baiano que sempre vi dançar nos circos-de-cavalinho e bumba-meu-boi, por um, dois, três homens. Pereira da Costa (Vocabulário Pernambucano, 66): "Dança rasgada, lasciva, movimentada, ao som do canto próprio, com letras, e acompanhamento a viola e pandeiro, e originário dos africanos, transformação das suas danças nacionais como o maracatu e o batuque. Do baiano muito em voga ainda, principalmente nos divertimentos e folganças rústico-campestres (o autor escrevia há quarenta anos passados), vem a música assim chamada pelo tom abaianado que a caracteriza." Sílvio Romero (Cantos Populares do Brasil, XV-XVI): "O tempo. Os figurantes, em uma toada certa, tem a faculdade do improviso e fazem maravilhas, os tocadores de viola vão fazendo o mesmo, variando os tons. Dados muitos giros na sala, aquele pára, vai dar uma umbigada noutro que se acha sentado e este surge a dançar. O movimento se anima, e, passados alguns momentos, rompem as cantigas e começam os improvisos poéticos. Aí se exerce uma força verdadeiramente prodigiosa e os cantos inspirados por motivos de ocasião e sempre com vivíssima cor local, ou varrem-se para sempre da memória, ou decorados e transformados, segundo o ensejo, vão passando de boca em boca, e constituindo esta abundante corrente de cantos líricos, que esvoaçam por toda a extensão do Brasil. O baiano é um produto do mestiço; é a transformação do maracatu africano, das danças selvagens e do fado português." Aluísio Alves (Angicos, Rio de Janeiro, 1940): " Baiano ou baião. Dança sapateada, em que os personagens davam castanholas do começo ao fim. Estes eram convidados da seguinte maneira: sentados ou em pé, esperavam que o tocador se aproximasse, requebrando-se e lhes fizesse uma cortesia, que constava de um cumprimento aberto, no qual a viola continuava a tocar. O primeiro contemplado, após o tocador sentar-se, saía pelo salão, dando castanholas, e logo jogava o lenço da sorte a outro. E assim sucessivamente, vinham dançar muitos dos presentes"(331). O Sr. Júlio Monteiro (citado na História da Música Brasileira, Renato Almeida, segunda edição, Rio de Janeiro, 1942) informa dançar-se o baião, sinônimo de baiano, como uma parte do samba, havendo outra maneira do convite à dança: "Forma-se de maneira diversa da que se usa em Sergipe e nos Estados do Sul: em vez da embigada, atira-se com os dedos um estalo de castanhola na direção da pessoa escolhida, até que se forma a quadra e, dada a vênia ao cantor, começa o baião"(161). Entre os cantadores sertanejos o baião não é canto nem dança. É uma breve introdução musical executada antes do "desafio", antes do debate vocal entre os dois cantadores. Denominam-se também rojão, rojão de viola, mais comumente. O pequenino trecho executado depois de cada cantador cantar (sextilha, décima, etc.) chama-se rojão ou baião (Luís da Câmara Cascudo, Vaqueiros e Cantadores, 143).
"Aderaldo quando ouviu
O baião que fez Siqueira."
O baião pode ser tocado a viola apenas, sem canto. Evocava o poeta Ferreira Itajubá (1876-1912):
"Como é doce o rojão das violas nas aldeias!
A lua cheia de abril refrescando as areias!..."
Luís Heitor (Danças Sertanejas," Cultura Política, 46 Rio de Janeiro, 1944): "O baião não é outra coisa senão o baiano, designação regional e uma das mais persistentes do samba.... O que o baião apresenta de especial, realmente, é o movimento rítmico sincopado" (302-303). No Diário de Pernambuco, de 14 de novembro de 1829, fala-se num "matutinho alegre, dançador, deslambido, descarado, que não tivesse dúvida em "quebrar o coco, e riscar o baiano" com umas poucas negras cativas no meio de uma sala perante mais de 20 pessoas sérias (E. Sales Cunha, Folclore de Alagoas e Outros Assuntos, 107-108, Rio de Janeiro, 1956).
CASCUDO, Luis da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Coleção Terra Brasilis. Rio de Janeiro. Ediouro, 1972. 127p.
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